“NOSTALGIA
NEO-REALISTA”
No
bar, onde se comia lingüiça acebolada
Com
pão à francesa, agora está um homem
Imensamente
gordo vendendo móveis usados;
As
livrarias, onde se comprava um livro de segunda
Ou
terceira mãos, ás vezes edições portuguesas;
Os
antiquários insondáveis, onde se encontrava até
O
gato profissional de dormir no balcão
Ou
no fundo da loja;
Os
lugares onde se achava um disco raro
De
Mário Reis à Jacob do Bandolim
De
Dolores Duran a discos de jazz
Ou
das grandes bandas dos anos 50,
Todas
essas relíquias, onde até a poeira
Das
teias de aranha nos faziam recordar
Tosses
asmáticas e antigos fantasmas;
Enfim,
todos esses lugares estão sendo ocupados
Por
estacionamentos, brexós de roupa e móveis velhos
Ou
simplesmente tombados para alargarem uma rua
Ou
para dar lugar a edifícios de não sei quantos andares.
Os
amigos, encontrados no centro da cidade,
Que
engoliam a pressa junto com um chope
Ou
uma sardinha frita;
Os
amigos que nos paravam para ver
O
faquir deitado na cama de pregos
O
equilibrista que deixava bolas e argolas
Caírem
ao chão a todo momento
E
se divertia com as vaias da platéia;
O
engolidor de pregos, de fogo, de gilete,
De
caco de vidro, que depois, passava o chapéu
Para
ser recompensado por tanta bravura,
Ah!
Esses amigos sumiram no tempo
Enclausuraram-se
em escritórios sob ar/ condicionados
Buscando
uma outra vida, em outras esferas
Perderam
a magia, o encanto desses autônomos
Artistas
de rua, improvisando
E
vendo a vida passar sem tanta angústia
Mas,
o que fazer? Estamos vivos
E a
ordem é renascer a cada minuto
Com
os olhos saltados de emoção,
De
perplexidade, de encantamento, de tédio
Somos
bichos da cidade
Conhecemos
a sarjeta
Cada
escombro, cada número
As
prostitutas nos olham com intimidade
A
noite nos traga no mesmo gole
Chegaremos
ao ano 2020
Com
o saco distendido de tanto pensar
Da
mesma forma que hoje
Sairão
caixões, simultaneamente,
Da
zona norte do Rio
E
de alguma parte do Brasil
Não
haverá grandes acompanhamentos
A
não ser de almas piedosas
E
pivetes prestadores de pequenos serviços
Por
enquanto, há pássaros no ar
E
parecem felizes
O
galo continua cantando ás cinco e triste da manhã
Em
Cascadura, Jacarepaguá, Campo Grande, Teresópolis
No
interior de uma cidade qualquer do Nordeste,
Onde
existia um galo querendo cantar logo cedo
Estamos
vivos, os olhos abertos
A
alma silenciosa
O
IML é um convite à loucura
Inscrevamo-nos
no Exército da Salvação
Na
Legião Estrangeira
No
Voluntariado Internacional
Liguemo-nos
ao Comitê Brasileiro pela Anistia
Ao
Ibase, à Abia
Apoiemos
a ABI, a OAB, a CNBB
Sigamos
o Papa aonde ele for
E
sejamos multidão estupefata
Ante
qualquer atentado
Tomemos
pinga com bolo de chocolate
Ultrapassemos
o sinal fechado
A
barreira do som
Sejamos
contra-mão ou alucinação
Leiamos
poesia bem alto
Para
acordar o passageiro
Que
dormiu com o cigarro aceso entre os dedos
Ouçamos
música clássica
Como
fundo musical ao vizinho
Que
só escuta samba-enredo e Martinho da Vila...
(Após
a parede há o muro
E,
segundo Sartre,
O
muro é o obstáculo
O
muro é a existência
Mas
não é a essência
A
coisa genuína é a terra
Que incha o muro e o derruba
É a
força que faz crescer o capim
Alto
até cobri-lo)
Nossos
mortos nos acompanham
E é
necessário continuar ouvindo
Os
que já se calaram
Na
hora em que dormimos
Eles
ficam nos protegendo
Ou
não fazem nada
Mas
ficam na nossa consciência
O
certo é não prometermos nada
Nem
construir sindicatos
Nem
federalizar a dor
E
distribuí-la em pílulas
Paliativos
acabam aumentando a resistência
Da
verdadeira dor incurada
Prometamos,
sim, resistir
Não
desejar nada
Além
do possuído
E
buscar o prazer no redescoberto,
Portanto,
vivenciado.
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